Perguntemos para uma das comunidades presente no Brasil muito antes de os Europeus aqui chegarem.
Para os Guarani M’Byá, os humanos somos chamados a ser verdadeiros porque Nhanderu – Nosso Pai Primeiro Último – nos fez à sua imagem como PALAVRAS-ALMAS VERDADEIRAS.
Assim, o verdadeiro está ligado não ao que é exato, mas àquilo que realiza plenamente o projeto que vem de dentro de cada ser, de dentro de cada comunidade. Eles dizem: Nhanderekó – nosso jeito de viver – é a verdadeira realização do projeto que Nhanderu nos confiou. É um projeto de beleza.
HÁ QUE LEMBRAR SEMPRE A OBRA DE ARTE QUE VAMOS SENDO: PALAVRAS VERDADEIRAS.
Na língua tupi e também no Guarani M’byá atual, o sufixo –eté expressa aquilo que é verdadeiro, aquilo que não pode ser esquecido, o que está no coração. Assim é que yaguar serve para vários animais: desde cachorro até onça. Quando junta –eté, aí quer dizer que tem muito valor, que é autêntica. Jaguareté é a “onça máxima”, a mais excelente, veloz, forte, verdadeira. Já o contrário faz-se com –ana, no sentido de fracasso. Parece mas não é. Jaguareté é onça verdadeira, jaguarana é cãozinho medroso que foge até de macaco…
Assim também, a festa é areté, isto é, o tempo (ara) autêntico, verdadeiro (eté). O tempo verdadeiro não é o que se gasta explorando e contabilizando lucros, mas é o tempo da beleza transbordante e compartilhada.
A Terra pode ser yvyeté, se é a terra boa e fértil, mas não será assim chamada se foi contaminada de agrotóxicos, devastada de injustiças. A terra cheia de violência e exploração não será yvyeté pois os humanos perderam o que é autêntico, deixaram de lado a busca pela yvy maran ei – a terra sem males.
Tietê era o rio verdadeiro. Do jeito que está era melhor chamar Ti-ana.
O ser humano bom mesmo, é ava-eté (ou Abaeté), ou seja, o ser humano de verdade.
Yawaretê
Milton Nascimento
Senhora do fogo, Maria, Maria. Onça verdadeira, me ensina a ser realmente o que sou. Põe a sua língua na minha ferida. Vem contar o que eu fui, me mostra meu mundo. Quero ser jaguaretê
Meu parente, minha gente. Cadê a família onde eu nasci?
Cadê meu começo, cadê meu destino e fim?
Para que eu estou por aqui? Senhora da noite, senhora da vastidão
Tem de guerrear, lutar, matar prá sobreviver pois assim é a vida
Quem vem lá? É a onça que já vem comer
Quero ser a onça, meu jaguaretê.
Quero onçar aqui no meu terreiro. Vou onçar sertão e mundo inteiro.
Já está na hora da onça beber o seu. Vou dançar com a lua lá no céu
Ouvir pegadas e pegar. Seguir a sina de sangrar prá se alimentar
Dama de fogo, Maria, Maria,
Onça de verdade, quero ter a luz, ouvir o som caçador
Me diz quem sou, me diz quem fui
me ensina a viver meu destino
Me mostra meu mundo, quem era que eu sou.
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